quarta-feira, 14 de junho de 2017

ORÓS. Retenção de veículo com IPVA atrasado é ilegal.

A posição aqui apresentada sobre a legalidade da apreensão ou retenção de veículos por atraso de IPVA representa o entendimento de especialistas e com base em diversos julgamentos de Tribunais, porém, esse não é um entendimento pacificado. O intuito do Blog é fomentar o debate. No final disponho links para pesquisas sobre o tema. 

Dois vídeos publicados no perfil do facebook de um servidor público federal do INSS em Orós/CE tem gerado grandes debates. O caso refere-se à atuação dos agentes do DEMUTRAN de Orós que recolheu sua moto por atraso do IPVA. O servidor alega no vídeo que ao ser abordado estava com a CNH, os documentos do veículo, de capacete e cumpria exigências para trafegar livremente, o único inconveniente era o IPVA atrasado, mesmo assim os agentes do DEMUTRAN/ORÓS apreendeu sua moto, invocando o Poder de Polícia conferido à Administração Pública.

Nos vídeos compartilhados de forma massiva nas redes sociais vi diversos comentários e pude observar alguns equívocos, principalmente no tocante ao Poder de Polícia. Assim resolvi publicar esse artigo afim de contribuir para o melhor entendimento sobre o que é esse tal Poder de Polícia, bem como o que diz o mundo jurídico sobre a legalidade de apreender ou não veículo com IPVA atrasado. Vamos aos fatos.

A revista Consultor Jurídico – Conjur consultou tributaristas em julho do ano passado que disseram ser INCONSTITUCIONAL apreender veículos em blitz por estarem com o IPVA atrasado, ressalta ainda ser isso uma arbitrariedade praticada em diversos locais do Brasil.

O entendimento é de que nenhum tributo pode ser cobrado de maneira coercitiva, ou seja, forçada, coagida. Vejamos o que dizem alguns especialistas tributários:

Korff Wagner, vice-presidente do Instituto de Estudos Tributários e sócio da Lippert Advogados: "O Estado tem outros meios de cobrança previstos em lei para exigir o imposto atrasado. Deve ser ofertado ao proprietário do veículo discutir a cobrança do imposto citado sem ser privado do seu direito de propriedade". 

Guilherme Thompson, especialista em Direito Tributário, do Nelson Wilians e Advogados Associados, explica: “A utilização da apreensão do veículo como método de cobrança configura uso abusivo de poder de polícia, pelo ente público, com reflexos sobre a violação do devido processo legal, bem como violação ao princípio constitucional do não confisco.”  

Já o advogado Igor Mauler Santiago, do Sacha Calmon – Misabel Derzi diz que é descabido a apreensão de bens detidos pelo contribuinte, compara o feito como expulsar alguém de sua casa porque está com o IPTU atrasado, que só voltará a morar nela caso coloque em dias o imposto.

Os casos já foram apreciados pelo Tribunais e na Bahia o Governo do Estado foi obrigado a se abster de apreender veículos por atraso de IPVA, sob multa de R$ 50 mil por operação de Blitz. Entretanto, tal decisão “não impede que o motorista pego em flagrante receba uma multa e pontos na Carteira Nacional de Habilitação, decorrente da falta do Certificado de Registro e de Licenciamento de Veículo (CRLV), documento gerado apenas para quem está com o imposto em dia.

O PODER DE POLÍCIA

De uma forma simples, sem se aprofundar no Direito Administrativo, gostaria de explicar um pouco o que significa o Poder de Polícia para a Administração. Em muitos comentários vi pessoas alegando que esse Poder é conferido apenas ao Estado (Federal/Estadual), excluindo assim os municípios. ISSO É UM EQUÍVOCO.

O Poder de Polícia é uma prerrogativa da Administração Pública e isso inclui os municípios. Mas o que é Poder de Polícia? Este Poder parte do fundamento da supremacia do interesse público sobre o interesse privado, o Poder de Polícia nada mais é que uma limitação às garantias individuais para que se sobressaia o interesse coletivo.

Por exemplo, o cidadão tem direito de ouvir som fazendo suas atividades ou simplesmente se divertindo depois de uma semana de trabalho, porém, quando coloca o som muito alto a ponto de impedir outras pessoas de estudarem, de descansarem, a polícia vai intervir baixando o volume, se insistir vai apreender o aparelho de som. Nesse caso houve uma limitação de uma garantia individual de escutar o som para que fosse preservado interesse coletivo do sossego.

Da mesma forma, o agente de trânsito ao aplicar uma multa faz uso de seu Poder de Polícia para preservar a segurança coletiva no trânsito, evitando um acidente que possa até levar inocentes à morte. Mas não é porque os agentes de trânsito possuem poder de polícia que estão livres para agir de acordo com o que consideram justo, com o que acham certo.

Não se pode pensar em Administração Pública sem levar em conta o Princípio da Legalidade, que diz que a Administração somente poder agir de acordo com a lei. Assim, mesmo que o agente de trânsito tenha uma certa liberdade para atuar conforme sua conveniência e oportunidade, essa liberdade só vai até aonde a lei permite, não havendo possibilidade de agir diversamente do que ela determina, passar disso é cair na ilegalidade, arbitrariedade e indiscutível abuso de poder.

No caso específico do vídeo aqui comentado, o agente de trânsito invocou erroneamente o Poder de Polícia para apreender a moto, visto que, como já vimos acima, é INCONSTITUCIONAL apreender veículo por atraso de IPVA. Não se pode cobrar o pagamento de imposto tomando um bem de um proprietário. Portanto, mesmo tendo poder de polícia, apreendendo o agente de trânsito veículo em atraso estará extrapolando os limites que a lei lhe confere e nesse caso não é qualquer lei, mas a maior de todas: a Constituição Federal. Fere o Princípio da Legalidade, não age com a finalidade vinculante do Poder de Polícia que é usada somente e tão somente para defender o interesse coletivo e não obrigar o pagamento de imposto.

FONTES: Conjur - Carro não pode ser apreendido em blitz por causa de IPVA atrasado, dizem tributaristas (acesse aqui).

                 Âmbito Jurídico - O Poder de Polícia (acesse aqui).

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